Uma pesquisa desenvolvida na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) busca tornar produtos cárneos processados em alimentos mais saudáveis ao corpo humano. A técnica inédita de microencapsulamento é desenvolvida pela doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos, Rosane Heck, de 35 anos. O método enriquece hambúrgueres ou outros alimentos do tipo, como embutidos, com ômega-3 (nutriente rico em benefícios que é encontrado em peixes, linhaça e castanhas, e que pode ser utilizado para controlar os níveis de colesterol e glicemia) sem alterar gosto e cheiro.
A novidade já despertou o interesse de empresas do Brasil e da Europa e a empresa criada por Rosane, incubada na Agência de Inovação e Transferência de Tecnologia (Agittec), deve começar a fornecer os insumos para a indústria de alimentos até o final do ano. A notícia também movimentou o cenário científico e repercute, desde 2017, na principal revista científica sobre o tema no mundo, a Meat Science.
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Os estudos começaram há seis anos, quando Rosane ingressou no mestrado, na UFSM. Formada pela Unipampa em Engenharia de Alimentos, a pesquisadora, nascida em Alecrim, no noroeste do Estado, agora é CEO da w3 Special Ingredients e vê um futuro promissor na tecnologia. O trabalho contou com a orientação do professor Paulo Cezar Campagnol e apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
A TECNOLOGIA
A ideia da técnica de microencapsulação é trazer saúde para um produto considerado, até então, não saudável.
- A pesquisa começou com a substituição lipídica de produtos cárneos cozidos. Isso significa que vamos retirar a gordura saturada e colocar óleos ou ômega-3. Então, buscamos uma alternativa para fazer essa substituição - relata Rosane.
Basicamente, a técnica consiste em incluir as cápsulas com ômega-3 diretamente no hambúrguer, por exemplo. As cápsulas medem 0,003 milímetros e são invisíveis a olho nu. Elas também são resistentes ao aquecimento e podem ser congeladas sem que o nutriente perca as propriedades. A inovação presente na técnica desenvolvida por Rosane está no fato de que ela consegue mascarar os sabores e odores à peixe, característicos do ômega-3. Há também o gatilho da liberação do nutriente. As microcápsulas passam pelo estômago e são dissolvidas apenas no intestino, que tem um PH alcalino, o que favorece uma melhor absorção do produto.
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Durante os quatro anos de doutorado, foram realizados testes para verificar a confiabilidade e aplicação de diversas técnicas. Cada lote produzido era testado por 120 dias no âmbito físico-químico e também sensorial. Uma equipe com 100 pessoas testou os produtos, com resultados positivos, sem alterações no gosto ou consistência.
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Mas a tecnologia não fica restrita a produtos cárneos. As microcápsulas podem ser utilizadas em outros alimentos, como sorvetes, sachês de café e até mesmo suplementos como o whey protein. Da mesma forma, o nutriente da cápsula também pode variar. Até o momento, o foco foi no ômega-3 por ser o tema da pesquisa de Rosane, mas outras vitaminas e nutrientes podem ser utilizados.
- Também conseguimos aplicar a técnica em produtos cárneos e veganos. Estamos usando materiais com componentes de origem vegetal. São biodegradáveis e de fontes renováveis - acrescenta a pesquisadora.
REPERCUSSÃO
O primeiro trabalho científico sobre o tema foi publicado em 2017 na revista Meat Science, referência mundial no assunto com conceito A1 (melhor conceito). O trabalho da UFSM liderou, entre todos os artigos publicados pelo periódico, o número de citações por dois anos, e se mantém nas primeiras posições até hoje. Tudo isso chamou a atenção de empresas europeias e brasileiras.
Já foram feitas experiências da aplicação da técnica em escala industrial. Em um teste com uma grande rede de hamburgueria do Rio Grande do Sul, o preço da adição do nutriente para cada hambúrguer de 200 gramas foi de R$ 0,30.
- Quando se fala em produtos que trazem saúde, os consumidores já estão prontos para pagar um pouco a mais - avalia Rosane.
A w3 Special Ingredients deve entrar de vez no mercado até o final do ano, no modelo de negócios conhecido como B2B. A ideia é que a empresa forneça os insumos para que as indústrias de alimentos produzam e comercializem o produto.
COMO FUNCIONA
- Microcápsulas invisíveis ao olho nu são enriquecidas com ômega-3
- As cápsulas são adicionadas a produtos cárneos processados
- Não há alteração no sabor e na consistência
- As microcápsulas têm resistência térmica e se rompem apenas no intestino humano
- A mesma técnica pode ser usada com outros nutrientes e adicionada em diversos produtos